quarta-feira, 3 de janeiro de 2007

Returns

Tenho pensado bastante no tempo, no tempo que não passa, nos dias que não mudam, na paisagem que se repete pelas mesmas janelas. O mesmo formato, a mesma chuva e os poucos dias que me restam longe de casa. Tenho pensado bastante no tempo, no tempo de histórias repetidas, nas ideias desconhecidas, no clima suave que toda reconciliação parece pedir. Bons amigos, brincadeiras sadias e não lembro de outra vez ter deitado minha cabeça num travesseiro cercado de tanta felicidade. Tenho pensado no quão tudo isso é incrível e sinto-me docemente constrangido de ter de escrever. O som harmonioso da água que não pára de correr, o céu estranhamente iluminado durante a noite, os espelhos na penumbra me desenhando como um bom desbravador. Eu não me canso dos afrosambas, do café pela manhã, do tarô e dos cogumelos que não nos deixam dormir. Também me canso, pois quando os dias se repetem, logo minha atração pelos estados de permanência e mudança são postas em xeque, a transcendência pouco importa, o tédio se impõe, de modo que, tal qual os vaga-lumes que pousam e partem de nossos corpos, preciso saltar ao longe para dar sentido a tudo que não vejo dentro da névoa.

Tenho pensado bastante no tempo, no sentindo que damos aos poucos milésimos e na ausência que afundamos os dias. De fato, repousar demais dentro de uma casa, na impossibilidade de correr, me estremece como um ataque claustrofóbico. Preciso dos olhos humanos, dos buracos nas calçadas, preciso perambular por aí. Pouco me importam as unhas, os sorrisos, a sagacidade, nem sempre os homens são capazes de me dar o que quero, mas preciso deles ainda assim. Sei muito bem que a humanidade me cansa, mas sua negação me aprisiona. Sinto-me perturbado, inundado de uma solidão sem tamanho, com vontade de escutar uma voz qualquer pela primeira vez. O excesso de calmaria me entedia, mas não instantaneamente: são precisos dias e dias e dias suficientes já passaram. Preciso ir embora. Os chás, a temperatura, os cobertores, os queijos, o queijo com mel e todas as comidas estavam ótimas, as músicas e danças organicamente sincronizadas. Nunca estive num ambiente de uma paz tão completa, no entanto, agora é hora do homem sair da mata, meditar no meio da Avenida Paulista e inalar a fumaça de cada um dos carros. Tenho pensado bastante no tempo, no tempo e nas pessoas e é incrível como consigo sentir saudade de tudo.